O procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, pede ao Supremo Tribunal Federal (STF) que conceda liminar para garantir a execução imediata da ordem de prisão contra os condenados pela Chacina de Unaí, ocorrida em 2004, em Minas Gerais. Três pessoas foram condenadas pelo assassinato de servidores do Ministério do Trabalho, após julgamento do Tribunal do Júri realizado no fim de 2015. No entanto, aguardam em liberdade o cumprimento das penas por decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Na reclamação 59.594, enviada ao STF, o PGR contesta acórdão da Quinta Turma do STJ que impediu a execução provisória das penas. A decisão proferida no Recurso Especial 1.973.397/MG beneficiou os réus, condenados a penas que variam de 31 a 65 anos de reclusão, pela prática dos crimes.
Para o MPF, ao analisar o caso, o STJ desconsiderou a norma prevista no artigo 492 do Código de Processo Penal (CPP) – na redação dada pela Lei 13.964/2019 – que determina a execução imediata de pena igual ou superior a 15 anos aplicada pelo Tribunal do Júri. Ao não aplicar o dispositivo, a Corte contrariou o Enunciado 10 da Súmula Vinculante, na avaliação do PGR.
A súmula estabelece que os tribunais só podem afastar a aplicação de leis ou atos normativos vigentes, de forma integral ou parcial, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, e não por órgão fracionário, que é o caso da Quinta Turma do STJ. A chamada reserva de plenário está prevista no artigo 97 da Constituição Federal. Essa regra poderia ter sido dispensada se já houvesse pronunciamento do órgão especial do Tribunal ou do STF sobre o tema, o que não ocorreu até o momento.
Regra específica – Ao afastar a execução imediata das penas impostas pelo Tribunal do Júri, a Quinta Turma do STJ alegou aplicar o entendimento firmado pelo STF no julgamento das ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs) 43, 44 e 54. Na ocasião, a Corte declarou inconstitucional a prisão automática do réu após a condenação em segunda instância. Isso porque o artigo 283 do CPP exige o trânsito em julgado da condenação para o início do cumprimento da pena.
Para Augusto Aras, no entanto, esse entendimento não pode ser aplicado ao caso da Chacina de Unaí, visto que há regra específica no próprio CPP dispensando o trânsito em julgado da decisão para o cumprimento imediato de condenações aplicadas pelo Tribunal do Júri, quando superiores a 15 anos de prisão (artigo 492). A norma é alvo de questionamento em ações ainda em trâmite no STF, mas, até o momento, não há nenhuma decisão da Corte, com caráter vinculante, que considere ilegítima a execução provisória de penas decorrentes de sentenças do júri popular.
O PGR lembra, ainda, que há precedente da Primeira Turma do próprio STF no sentido de que a norma não viola o princípio da inocência. Segundo ele, o Tribunal do Júri é a representação da vontade da sociedade, sendo instrumento de efetiva participação popular. Por isso, o respeito à soberania das suas decisões é princípio preponderante para a eficácia da persecução penal, conforme ressalta Aras na ação. “A resposta dada à sociedade e pela sociedade aos crimes contra a vida há de ser efetiva, não se encerrando no mero julgamento dos acusados por seus pares. Para tanto, é necessário o efetivo cumprimento de suas decisões”, conclui.
Histórico – A Chacina de Unaí foi o assassinato dos auditores fiscais Nelson José da Silva, João Batista Lages e Erastótenes de Almeida Gonçalves, acompanhados do motorista Ailton Pereira de Oliveira, que ocorreu na manhã de 28 de janeiro de 2004. Os quatro foram emboscados e mortos a tiros em uma estrada rural do município de Unaí (MG), quando se dirigiam para fiscalizar fazendas da região.
Como resultado da denúncia apresentada pelo MPF, os réus foram condenados pelo Tribunal do Júri, em novembro de 2015, a 96, 47 e 98 anos de prisão. Em 2018, as condenações foram mantidas pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), que, no entanto, reduziu a pena imposta aos três para, respectivamente, 58, 31 e 65 anos de reclusão.
Após a manutenção da condenação pelo TRF1, foi determinado o início da execução provisória das penas. Contudo, em razão da mudança de entendimento pelo STF acerca do cumprimento da pena após condenação em segunda instância, a decisão foi revista e os réus permanecem em liberdade.
Fonte: Ministério Público Federal