Em manifestação enviada ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), o Ministério Público Federal (MPF) apontou irregularidade em regra fixada pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) para a aplicação da contagem em dobro da pena para pessoas presas no Complexo Penitenciário do Curado. Verificada a superpopulação e as condições subumanas e insalubres no local, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) determinou que fossem adotadas uma série de medidas para contornar a situação. Uma das determinações foi contar em dobro cada dia de pena cumprido pelos detentos, com exceção daqueles acusados ou condenados por crimes contra a vida, a integridade física, ou de crimes sexuais. No entanto, conforme constatado pelo MPF, o TJPE, contrariando a CIDH, ampliou a lista de delitos para os quais não poderia ser concedido o benefício.
O assunto é discutido em Habeas Corpus (HC) apresentado pela Defensoria Pública do Estado de Pernambuco contra as cinco teses fixadas pelo TJPE para aplicar a decisão da CIDH. No parecer, a subprocuradora-geral da República Luiza Frischeisen considera que, em quatro delas não há divergência com as determinações da Corte Internacional, já que o tribunal apenas explicou a forma de adoção das medidas no ordenamento jurídico nacional. A irregularidade, de acordo com a suprocuradora-geral, está na modificação feita pelo TJPE para ampliar a lista de delitos que não seriam considerados para fins de contagem de pena em dobro. Além dos crimes sexuais, contra a vida ou a integridade física, previstos pela CIDH, o TJPE incluiu os crimes hediondos.
Para exemplificar a alteração feita pelo tribunal, o parecer do MPF cita o crime de tráfico de drogas. Por ser delito hediondo, não consta das restrições da CIDH, mas da lista mais ampla criada pelo TJPE. Na manifestação, Luiza Frischeisen lembra que, desde 1992, o Brasil é país signatário da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, com o reconhecimento de pleno direito e por tempo indeterminado da competência jurisdicional da Corte Interamericana de Direitos Humanos. “É importante destacar a força vinculante dos tratados de direitos humanos, bem como a impossibilidade de normas internas justificarem o descumprimento de acordos internacionais, conforme disposições dos arts. 26 e 27 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados”, destaca a subprocuradora-geral da República.
Nesse contexto, o MPF requer o conhecimento do habeas corpus e, também, que seja excluída das recomendações do acórdão do TJPE a vedação dos crimes hediondos para cômputo em dobro. O pedido é para que a lista se adeque ao que está expressamente previsto na resolução da CIDH.
Além disso, a manifestação ministerial frisa que o juiz da Execução Penal é responsável pela aplicação da regra prevista pela CIDH, sendo necessário avaliar cada caso. Dessa forma, o magistrado, ao analisar a conta de liquidação de pena de cada sentenciado, deve adequar a decisão da Corte Internacional à legislação penal brasileira, como, por exemplo, considerar quais seriam os crimes enquadrados em delitos contra a integridade física, crimes sexuais e crimes contra a vida.
Fonte: Ministério Público Federal