A procuradora-geral da República, Elizeta Ramos, se manifestou contrariamente à interpretação que considera indispensável o requisito da habitualidade para caracterização do tipo penal de exploração sexual de crianças e adolescentes, previsto no artigo 244-A do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). “No entender da Procuradoria-Geral da República, sendo esporádica ou habitual, e inexistindo previsão legal expressa, a conduta é suficiente para caracterizar a prática de crime”, afirma a PGR.
A manifestação se deu em memorial enviado aos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), nesta quinta-feira (19), em agravo interno, que questiona decisão que negou seguimento a um recurso extraordinário do Ministério Público Federal (MPF) que pretende discutir o tema. Ao negar seguimento do recurso do MPF, já admitido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), o ministro relator, Luís Roberto Barroso, avaliou que ultrapassar o entendimento firmado no acórdão recorrido demandaria análise de normas infraconstitucionais, não ostentaria caráter constitucional e exigiria reexame fático-probatório, de modo que estaria ausente o requisito da repercussão geral.
No memorial, a procuradora-geral da República aponta que, embora a controvérsia aborde a legislação ordinária do Estatuto da Criança e do Adolescente, a índole da discussão é constitucional, “visto que diz respeito à efetiva proteção de crianças e adolescentes, à luz das normas constitucionais e dos tratados internacionais assinados pelo Brasil”. A PGR aponta ainda a existência de repercussão geral da matéria, uma vez que, sendo reconhecida a necessidade de habitualidade para a caracterização do crime de exploração sexual de crianças e adolescentes, é necessário que o STF fixe jurisprudência com o propósito de determinar que lapso temporal equivaleria ao conceito de constância, para fins de enquadramento da conduta no art. 244-A do ECA.
A procuradora-geral também destaca dados do Ministério dos Direitos Humanos, apontando para o aumento do número de denúncias de violações de direitos humanos de crianças e adolescentes, totalizando 9,5 mil denúncias e 17,5 mil violações envolvendo violências sexuais, físicas – abuso, estupro e exploração sexual – e psíquicas. “Essa dimensão também reforça a importância na atuação do Ministério Público brasileiro, desde a origem, em defesa das crianças e dos adolescentes, com o propósito de que sejam preservados, em especial, os direitos humanos desse grupo vulnerável”, ressalta Elizeta Ramos.
Diante disso, a PGR pede que o recurso extraordinário seja examinado no Plenário Virtual do STF, a fim de que se reconheça a repercussão geral da matéria. Após isso, pede que seja dada nova vista dos autos ao MPF, para manifestação acerca do tema que vier a ser definido.
No caso de o Supremo afastar a aplicação da sistemática da repercussão geral, a PGR se manifesta pelo provimento do recurso, para que seja restabelecida a decisão condenatória proferia pelo Tribunal de origem, indeferindo com isso o habeas corpus concedido pelo STJ, que havia reconhecido o requisito da habitualidade como indispensável para a caracterização do tipo penal de exploração sexual previsto no ECA.
Fonte: Ministério Público Federal