Falta de manutenção das escolas, obras inacabadas, carência de professores, falha no fornecimento de água potável e energia elétrica, crianças estudando em espaços incompatíveis com a dignidade humana. Esses são alguns dos problemas identificados pelo Ministério Público Federal (MPF) na rede de ensino do Arquipélago do Bailique, distrito de Macapá (AP). Para que as irregularidades sejam sanadas, o órgão expediu recomendações cobrando providências dos governos estadual e municipal. Os documentos foram entregues às autoridades no último dia 6.
A precariedade das condições das escolas municipais e estaduais foi constatada após inspeções e audiência pública realizadas na localidade em março deste ano. Também foram coletadas informações de diretores das escolas, por meio de questionários que abordaram aspectos estruturais, inclusão, alimentação escolar, programas de governo, pedagógicos e atuação dos gestores públicos. A iniciativa faz parte do Projeto Ministério Público pela Educação (MPEduc).
Nas recomendações, o MPF ressalta que o avanço da erosão no arquipélogo, fenômeno conhecido por terras caídas, tem causado a vulnerabilidade de diversas estruturas públicas da rede escolar do Bailique. O cenário, segundo o órgão, demanda medidas urgentes a fim de evitar situação de risco para o corpo docente e discente dos estabelecimentos de ensino localizados no distrito.
A procuradora regional dos Direitos do Cidadão no Amapá, Sarah Cavalcanti, destaca ainda as peculiaridades geográficas do arquipélogo, formado por oito ilhas isoladas, localizadas à margem esquerda do Rio Amazonas. Distante cerca de 200 km da capital Macapá, o distrito conta com 52 comunidades às quais o único meio de acesso é pela via fluvial, numa viagem que dura aproximadamente 12 horas.
Escolas municipais – Na Recomendação 10/2023, o MPF solicita ao prefeito de Macapá, Antônio Furlan, e à secretária Municipal de Educação, Leyse Monick França Nascimento, melhorias urgentes em todas as escolas municipais localizadas no arquipélogo. Entre as medidas requeridas estão a contratação de professores para suprir a necessidade existente, ações para assegurar o fornecimento de água potável e aquisição de placas de energia solar ou motor de energia elétrica, com disponibilização de combustível.
A recomendação também cobra a aquisição de extintores de incêndio, a instalação de bibliotecas, e a reforma ou construção de porto adequado para atracação dos barcos do transporte escolar. Requisita, ainda, a realização de vistorias para elaboração de laudo técnico das condições das escolas municipais do distrito do Bailique bem como a apresentação de cronograma de execução das reformas e manutenções necessárias.
O MPF também recomendou medidas especícificas para cinco escolas do arquipélogo. Para a Escola Municipal Jaranduba do Bailique, foi solicitada a reforma da estrutura física, pois a sala de lazer das crianças, assim como a área da frente, está com a parede de madeira completamente apodrecida. Além disso, as salas estão com goteiras, há paredes de madeira com pregos à mostra, não existe espaço adequado à turma de educação infantil, há odor de mofo e o banheiro não tem saída de ar. Também foi recomendada a contratação de professores, pois existem apenas três educadores para sete turmas e a unidade não conta com professor de atendimento escolar especializado.
Em relação à Escola Municipal Rosa de Saron, foi solicitada a construção de uma nova unidade em outra área, pois a atual foi edificada em cima de um córrego e em época de maré alta ou de muita chuva, a escola alaga. Foi recomendado ainda que a nova unidade disponibilize biblioteca e área de lazer para as crianças, o que não ocorre atualmente, e que sejam contratados mais educadores. Também foram indicadas melhorias para a Escola Municipal Vila Progresso: contratação de mais três professores e de uma merendeira; construção de um porto adequado para atracação dos barcos do transporte escolar, uma vez que a passarela onde o transporte escolar atracava foi derrubada pela erosão; e aquisição de combustível para a energia da escola.
As seguintes medidas foram requisitadas para a Escola Municipal Canal dos Guimarães: contratação de professores, aquisição de equipamentos adequados para cozinha (armários, geladeira, panelas), e a conclusão da obra, uma vez que o prédio foi inaugurado em 2019, ainda pendente de finalização, o que vem ocasionando goteiras e paredes de madeira apodrecidas, entre outros problemas. Já para a Escola Municipal Claudete Mota Rocha, foram solicitadas a contratação de professores, aquisição de combustível para o gerador da escola, e a transferência da direção do caixa escolar para a unidade de ensino mais próxima.
Escolas estaduais – A Recomendação 11/2023 foi enviada ao governador do Amapá, Clécio Luís Vilhena Vieira, e à secretária de Educação do Estado, Sandra Casimiro. No documento, o MPF cobra melhorias para as escolas Igarapé Carneiro, Bosque do Amapá-Módulo Regional do Bailique, Itamatatuba, Cláudio dos Santos Barbosa, Igarapé Grande do Curuá, Bento Tolosa de Santana, Maria José Campelo Silva, Benevenuto Soares Rodrigues, Júlia Bruno, Orlantino Teuna Campos, Franco Grande, Franquinho do Bailique, Igarapé do Buritizal, João Henrique da Silva e todas as demais unidades da rede estadual do distrito.
Entre as medidas recomendadas, estão contratação de professores para atendimento especializado; aumento na quantidade de barcos para realização do transporte escolar; e reforma, reconstrução ou manutenção das escolas, de acordo com a necessidade de cada unidade. O MPF também pede aumento no fornecimento de combustível para energia e no valor repassado para merenda; construção de porto para atracamento do transporte; e realização do serviço de dedetização. Requer ainda a aquisição de livros, computadores, mobiliário, materiais pedagógicos e utensílios de cozinha; contratação de transporte escolar; instalação de extintores de incêndio; e fornecimento de água potável.
O período para realização das ações varia de 30 dias a seis meses, a contar do recebimento das recomendações. Em caso de descumprimento, o MPF poderá adotar medidas administrativas e judiciais cabíveis.
Saiba mais – Lançado em abril de 2014, o MPEduc é fruto de parceria entre o Ministério Público Federal (MPF) e o Ministério Público dos Estados com o objetivo de defender o direito à educação básica de qualidade. Por meio de audiências públicas, aplicação de questionários e reuniões com a comunidade, o projeto busca fazer um diagnóstico dos principais problemas enfrentados na localidade, construindo, de forma coletiva e democrática, possíveis soluções para as dificuldades identificadas. Atualmente, o projeto está sob a gestão da Câmara de Direitos Sociais e Fiscalização de Atos Administrativos em Geral do MPF (1CCR), responsável pela condução dos trabalhos em todo o país. Saiba mais aqui.
Fonte: Ministério Público Federal