O Ministério Público Federal (MPF) realizou atendimentos e participou de reuniões para tratar de assuntos de interesse de povos indígenas e comunidades tradicionais da região do Oiapoque, no extremo norte do Amapá, durante ação itinerante realizada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (TRT-8) e instituições parceiras. A Jornada Cidadã aconteceu entre os dias 29 de junho e 7 de julho e também incluiu ações médicas, odontológicas, rodas de conversa, oficinas e palestras.
O MPF foi representado pela coordenadora da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6CCR), Eliana Torelly, e pelo procurador da República no Amapá Alexandre Guimarães. Durante a expedição, eles visitaram a comunidade quilombola Kulumbu do Patuazinho e as aldeias indígenas Kuahí e Kumarumã para ouvir as demandas locais e identificar questões que poderiam ser intermediadas pelo órgão federal.
“Foi um evento histórico que contou com a participação de diversas entidades. Tratamos de questões relacionadas à BR-156, mais especificamente sobre a pavimentação da estrada e a realocação de aldeias que ficam às margens da rodovia; além da infraestrutura de escolas indígenas, da necessidade de contratação de professores de educação indígena e da falta de medicamentos nas terras indígenas”, destacou Alexandre Guimarães.
Para a subprocuradora-geral da República Eliana Torelly, a participação do MPF na jornada itinerante vai ao encontro do esforço da atual gestão de ampliar e fortalecer a presença da instituição na Região Amazônica. Ela lembrou que, em maio do ano passado, foram criados 30 ofícios socioambientais para atuação na região. Além disso, foram adquiridas embarcações e aeronaves para facilitar o deslocamento dos procuradores. “Nosso objetivo é estar cada vez mais próximos dos povos e comunidades tradicionais da Amazônia”, pontuou a coordenadora da 6CCR.
Educação indígena – Durante as inspeções, o MPF verificou que só há uma escola estadual atendendo a Aldeia Kuahí, que foi construída pela própria comunidade e encontra-se em condições precárias, com ausência de cadeiras e materiais. No caso da Aldeia Kumarumã, a escola municipal funciona em péssimas condições, e a estadual não é suficiente para suprir o quantitativo de alunos. Além disso, não há previsão de verba do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) para as escolas e nem custeio de frete para a entrega de merenda escolar.
Outro problema constatado foi a ausência de serviço de transporte escolar que contemple as aldeias localizadas junto à BR-156. Os indígenas relataram que não existe alojamento para professores do Sistema de Organização Modular de Ensino Indígena (Somei) nas aldeias subjacentes: Paramuaka, Flamã e Manaú, e apontaram a necessidade de aquisição de voadeira para deslocamento dos docentes, bem como contratação de pilotos. Cobraram, ainda, a realização de concurso público para contratação de novos professores, já que o último foi realizado em 2006.
Os membros do MPF também conversaram com lideranças das aldeias Kuahí e Kumarumã sobre os impactos da BR-156 na vida das comunidades, bem como sobre o andamento das tratativas para um acordo com o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit). Os indígenas afirmaram que a expectativa de realocação das aldeias tem sido utilizada pelo Estado para não implementação de políticas públicas na região. Assim, visando a uma assistência mais efetiva do Poder Público, sinalizaram que existe interesse na realocação de suas comunidades em local mais distante da rodovia, a partir do recebimento da devida indenização.
Saúde – Os representantes das aldeias indígenas também reclamaram da ausência de energia elétrica e da falta de saneamento básico. Conforme relatado, as comunidades utilizam energia de geradores à diesel, com manutenção custeada pela própria população, e não têm a acesso a tratamento de água e esgoto. Sofrem, ainda, com a falta de medicamentos controlados no polo base de saúde, especialmente para diabetes, hipertensão e outras doenças crônicas.
O MPF também esteve na Casa de Saúde Indígena (Casai) de Oiapoque, onde foi constatada a insuficiência de profissionais. Segundo apurado, o plano de trabalho de 2023 para contratação e manutenção de contratos dos trabalhadores da saúde ainda não foi assinado. Além disso, o quantitativo de técnicos e enfermeiros previsto para contratação não seria suficiente para a cobertura de todos os polos. As lideranças também solicitaram apoio do MPF para que se garanta vagas específicas para indígenas no concurso da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).
Demandas quilombolas – Durante a vista à Comunidade Quilombola Kulumbu do Patuazinho, as lideranças destacaram a ausência de escolas, postos de saúde ou qualquer outra política pública municipal e estadual voltada à população tradicional. Ressaltaram que não há transporte escolar para levar as crianças para escola no Oiapoque e nem sinal de internet na região.
Outra queixa foi a demora excessiva na certificação e demarcação de terras pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), o que gera uma série de inconvenientes à população. Foi relatada, por exemplo, dificuldade para registrar os filhos como quilombolas, tendo em vista que o cartório do município se recusa a realizar o registro pela falta de certificação. Por outro lado, as reiteradas invasões fizeram com que a comunidade recuasse na ocupação do seu território.
Saiba mais – O projeto Jornada Cidadã inclui diversas atividades de cidadania. A iniciativa é promovida pelo TRT-8, com apoio de diversas órgãos e entidades. Além do MPF, participaram da ação em Oiapoque as seguintes instituições: Exército, Governo do Amapá, Secretaria dos Povos Indígenas, Tribunal de Justiça do Amapá, Ministério Público do Estado do Amapá, Defensoria Pública do Estado do Amapá, Fundação Marabaixo, Prefeitura de Oiapoque, SuperFácil, INSS, Tribunal Regional Eleitoral do Amapá, Unifap, Ministério Público do Trabalho, Justiça Federal, do Distrito Sanitário Especial Indígena, Fundação Nacional dos Povos Indígenas, Secretaria de Cultura do Estado do Amapá, Defensoria Pública da União, Sebrae e Instituto de Pesquisa e Formação Indígena.
*Com informações do TRT-8 (https://www.trt8.jus.br)
Fonte: Ministério Público Federal