O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública, com pedido de antecipação de tutela, em desfavor da Fundação Nacional do Índio (Funai) e da União por conta da demora em iniciar e concluir o procedimento destinado à identificação e delimitação de território referente à comunidade indígena Kaingang de Pontão. Atualmente, a comunidade está acampada em imóvel da Ceasa (Centrais de Abastecimento do Rio Grande do Sul), localizado no município de Passo Fundo.
O pleito está em fase de qualificação, etapa preliminar e anterior à realização de estudos para a demarcação das terras indígenas, que são elaborados somente após a constituição do grupo técnico multidisciplinar responsável (primeira fase do procedimento demarcatório).
O MPF pede que a Funai publique a portaria de constituição do grupo de trabalho que elaborará o Relatório Circunstanciado de Identificação e Delimitação (RCID) referente ao povo indígena Kaingang de Pontão no prazo de 60 dias e que, dentro de 30 dias dessa publicação, apresente em juízo o plano de trabalho de elaboração do RCID. Pede também que o procedimento seja concluído no prazo máximo de 24 meses, além do pagamento de indenização por danos morais coletivos.
Ainda em 2013, a Funai informou ao MPF que a área localizada no município de Pontão, mais especificamente no distrito de Sagrisa, “era uma antiga reivindicação Kaingang” e que, para os indígenas, ocupar aquele espaço “se configuraria como uma retomada do seu território tradicional”.
Não obstante as autoridades municipais terem alegado, à época, haver estudos e laudos antropológicos que negariam a existência de indícios de ocupação tradicional indígena no local, a Funai esclareceu que ainda não fora constituído um grupo técnico para realização de estudos antropológicos, não sendo possível extrair uma conclusão sobre a existência ou não de tradicionalidade na área.
Em virtude de ações possessórias ajuizadas na ocasião, em 2014, o grupo indígena decidiu sair de Pontão e se instalou em imóvel pertencente à Ceasa, situado em Passo Fundo, onde se encontra desde então, porém sempre deixou claro que a mudança não implicava abandono da reivindicação territorial em Pontão.
Ademais, apurou-se que, em 2005, uma antropóloga contratada pela Funai elaborou um estudo de fundamentação antropológica nessa mesma área, onde se encontraram vestígios de ocupações tradicionais Kaingang – cemitérios indígenas, casas subterrâneas e uma vala de pedra. “Todos os lugares são sítios arqueológicos que merecem um estudo”, dizia o relatório dessa antropóloga. No entanto, mesmo tendo sido apontada a necessidade de aprofundar os estudos, isso não foi providenciado, pois, em março de 2021, a fundação indigenista informou ao MPF que o registro da reivindicação fundiária da Aldeia Butiá seguia no estágio de qualificação e que não havia previsão para a conclusão da atividade.
“Como se percebe, apesar da existência de processo administrativo desde 2006, passados 16 anos, a Funai não chegou sequer à fase de constituição de grupo de trabalho, pois os trabalhos de qualificação constituem simplesmente uma etapa preliminar da identificação e delimitação da terra indígena, criada pela fundação indigenista e que antecede inclusive a constituição do Grupo Técnico (GT)”, protesta o autor da ação civil pública.
Ainda de acordo com o MPF, “a demora da Administração Pública na conclusão da regularização fundiária vem causando enormes prejuízos para o grupo e para toda a população local. Além da insegurança jurídica, não se pode esquecer que muitos serviços públicos básicos constitucionalmente assegurados, como educação, saúde, saneamento, vêm sendo prestados de forma insatisfatória ou deficiente pelos órgãos responsáveis, sob a justificativa de que a área não está oficialmente reconhecida”.
Número da ação para consulta processual junto à Justiça Federal do RS: 5006329-50.2022.4.04.7104.
Fonte: Ministério Público Federal