Em crimes societários não há necessidade de expor minuciosamente e de forma individualizada a conduta de cada acusado para apresentação de denúncia. Esse é o posicionamento defendido pelo Ministério Público Federal (MPF) ao manifestar-se, no Supremo Tribunal Federal (STF), pelo seguimento da ação penal movida contra empresário acusado de sonegar Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) em Santa Catarina. O parecer ministerial foi no HC 217.862, no qual o empresário busca o trancamento da ação em que se tornou réu por sonegação de impostos, na condição de diretor executivo da Salfer. A rede de lojas de eletrodomésticos com sede em Santa Catarina compõe o Grupo Máquina de Vendas.
Contrário ao argumento da defesa do empresário, o MPF observa que a denúncia apresentada pelo Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) foi suficientemente clara e objetiva, a ponto de permitir ao réu “a exata compreensão do que está sendo acusado”. O MPSC comprovou que, em 2018, na qualidade de diretor da empresa e “sujeito passivo de obrigação tributária”, o empresário deixou de recolher o ICMS da Salfer por 17 vezes, gerando prejuízo aos cofres públicos de mais de R$ 7 milhões.
Para o MPF, a denúncia preencheu os requisitos mínimos do art. 41 do Código de Processo Penal (CPP), apontando a materialidade delitiva e os indícios de autoria do crime. No parecer, o órgão ministerial destaca que o caso não se trata de imputação criminal objetiva, sendo a responsabilidade do diretor executivo recolher os tributos, previsão contida no contrato social da empresa. O documento do MPF cita voto do ministro Marco Aurélio, no qual, segundo ele, “a denúncia que, nos crimes societários, narra fato típico determinado e específico e o imputa aos sócios diretores da empresa não revela acusação genérica”.
A subprocuradora-geral da República Cláudia Marques, que assina a manifestação, destaca diversos acórdãos do STF que consolidam a jurisprudência compatível com o recebimento da denúncia e o seguimento da ação penal. O Tribunal Supremo entende que é dispensável, em casos de crimes societários, descrição minuciosa, mostrando-se coerente “com os postulados do contraditório e da ampla defesa que se exponha o vínculo dos acusados com a sociedade comercial e que se narre as condutas delituosas de forma a possibilitar o exercício do direito de defesa”.
Marques esclarece que o trancamento da ação penal exigiria o revolvimento de provas e que a medida, pela via do habeas corpus, é excepcional. “O que é relevante no caso é que a descrição feita na denúncia permite ao paciente a exata compreensão do que está sendo acusado, sendo certo que a apuração da autoria diz respeito ao mérito da ação penal e será objeto da prova a ser produzida no curso da instrução, não sendo razoável a pretensão do impetrante de abortar prematuramente o processo criminal, sem permitir que o Ministério Público prove a sua imputação”, finalizou.
Íntegra da manifestação no HC 217.862/SC
Fonte: Ministério Público Federal