De um lado, rigor e ampliação das frentes investigações com a instauração de 160 novos inquéritos. Do outro, o respeito ao devido processo legal e aos direitos fundamentais dos investigados em todas as etapas da aplicação do direito penal. Essa premissa marcou a atuação da Procuradoria-Geral da República (PGR) na esfera criminal nos últimos dois anos. O balanço do trabalho do primeiro mandato de Augusto Aras à frente do Ministério Público Federal (MPF) revelam ainda o esforço para aumentar os acordos firmados – foram 36 ao longo do período – a chamada justiça restaurativa com a recuperação de recursos públicos desviados, o ressarcimento de vítimas e o pagamento de multas. Apenas em multas foi acertado o pagamento de R$ 213 milhões e US$ 4 milhões.
O trabalho para se apurar suspeitas da prática de crimes envolvendo a participação de autoridades com prerrogativa de foro nos tribunais superiores inclui a análise de centenas de casos, desde notícias de fato decorrentes de representações da sociedade, passando pelos inquéritos e sindicâncias e chegando às ações penais. No período, foram apresentas 46 tanto no Supremo Tribunal Federal (STF) quanto no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Boa parte já foi recebida pelos órgãos do Judiciário e atualmente está em fase de instrução processual. Como consequência, autoridades foram afastadas dos cargos, recursos que podem ter sido desviados dos cofres públicos foram bloqueados, além de outras medidas cautelares.
No caso dos acordos de colaboração firmados, a medida aponta para a instauração de dezenas de novas frentes de apuração. Também mereceu destaque na atuação criminal da Procuradoria-Geral da República, o total de operações realizadas. Foram 45 no total. Na última quinta-feira (23), durante solenidade que oficializou a recondução ao cargo, Augusto Aras mencionou parte dos dados da atuação criminal, destacando o fato de as medidas terem sido tomadas respeitando os direitos dos investigados. “Foram duas grandes operações em todo o país por mês durante dois anos, sem escândalo com respeito aos direitos e garantias fundamentais”, pontuou ao discursar no Palácio do Planalto.
Entre os casos apurados ou em fase de diligências estão os inquéritos instaurados para investigar suspeitas de desvios de recursos públicos destinados ao enfrentamento da covid-19 e de práticas criminosas envolvendo integrantes do sistema de Justiça. Nas duas frentes, dezenas de medidas cautelares foram cumpridas com o propósito de se reunir provas das ilegalidades. Apenas relacionadas à aplicação de recursos da área de saúde foram apresentadas pelo menos seis denúncias contra agentes públicos nos estados do Rio de Janeiro, Amazonas e Pará. A PGR, por meio da assessoria criminal segue acompanhando desdobramentos de suspeitas em outras unidades da Federação. O objetivo é garantir a responsabilização de quem ignorou as leis para obter vantagens financeiras em um momento em que os gastos com saúde foram ampliados em todo o mundo.
Em relação ao combate a crimes praticados por agentes que atuam no sistema de Justiça, o principal destaque foi a Operação Faroeste que desmantelou grande esquema que funcionava no Tribunal de Justiça da Bahia. Desembargadores, magistrados, servidores, advogados e empresários foram acusados de crimes como organização criminosa, lavagem de dinheiro, corrupção e venda de sentenças. Em decorrência das investigações, foram ajuizadas seis denúncias, mais de R$ 500 milhões foram bloqueados. Também houve o fechamento de acordos de colaboração premiada nos quais foi negociado o pagamento de multa pecuniária de R$ 65 milhões.
Medidas estruturantes – De forma paralela, desde o início da gestão, foi priorizada a adoção de medidas que pudessem garantir maior institucionalidade ao trabalho de combate à macrocriminalidade. Nesse sentido, o PGR fez, em mais de uma oportunidade, defesas enfáticas do sistema acusatório, consagrado na Constituição Federal. O tema foi inclusive objeto de uma arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), apresentada em maio de 2021, ao Supremo Tribunal Federal. O principal pedido é para que toda a legislação processual penal referente à fase de investigação seja interpretada em sintonia com o princípio acusatório. O objetivo é que o juiz sempre ouça o Ministério Público, titular da ação penal, antes de decretar medidas cautelares e proferir decisões que restrinjam direitos fundamentais dos cidadãos.
Também com o propósito de assegurar as condições de trabalho do MPF na apuração de crimes, o PGR defendeu, ainda em 2019, o compartilhamento de dados de órgãos de controle como o Conselho de Controle da Atividades Financeira (Coaf) e a Receita Federal, com o Ministério Público, independentemente de decisão judicial. Essa atuação foi decisiva para reverter a decisão até então em vigor. Além de permitir a retomada de milhares de investigações em todo o país, a decisão impediu que o Brasil sofresse sanções internacionais.
Outro avanço estrutural na atuação criminal do MPF foi a substituição do modelo de força-tarefa pelo de Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaecos) que, atualmente, existem em 16 estados. O modelo, implementado de forma gradativa, desde o início de 2020, trouxe estabilidade, garantiu aos integrantes mandato, respeito a princípios norteadores da carreira, como a antiguidade e previsibilidade ao trabalho. A criação dos Gaecos federais estava prevista desde 2013, após aprovação do Conselho Superior do MPF, mas foram implementados somente na atual gestão.
Cooperação internacional – O fortalecimento do trabalho na esfera criminal também incluiu a atuação em casos que envolvem outros países. Nesse sentido, buscou-se o fortalecimento de ferramentas modernas para a cooperação. Um dos destaques foi a formação de Equipes Conjuntas de Investigação (ECI), que permitem a adoção de técnicas mais rápidas e eficazes para a investigação e persecução de crimes complexos e transfronteiriços.
Entre as parcerias estão as estabelecidas com autoridades paraguaias e italianas para apuração de suspeitas de tráfico internacional de drogas, organização criminosa e outros delitos. Os acordos incluem o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional, do Ministério da Justiça e Segurança Pública brasileiro.
Em outra frente, a Secretaria de Cooperação Internacional intensificou as medidas para assegurar a recuperação de recursos enviados ao exterior por investigados e condenados em decorrência da atuação do MPF. O trabalho incluiu o acompanhamento de solicitações de assistência jurídica que permitiram a repatriação de cerca de US$ 112 milhões e de mais de 1,2 milhão de euros ao Brasil, valores que foram ilicitamente enviados à Suíça, ao Reino Unido, aos Estados Unidos e a Bahamas.
Fonte: Ministério Público Federal