Em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), o procurador-geral da República, Augusto Aras, defendeu que servidores públicos penalizados disciplinarmente com a cassação da aposentadoria possam utilizar as contribuições feitas ao Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) para se aposentarem pelo Regime Geral (RGPS). O entendimento do PGR foi apresentado na análise da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 750, de autoria da Associação de Delegados de Polícia do Brasil (Adepol). A entidade questiona a constitucionalidade de dispositivos do Estatuto do Funcionário Público do Recife (PE), que inclui a perda da aposentadoria entre as sanções impostas ao servidor que cometer infrações definidas por lei.
A ADPF requer a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 199, VI; 207, I a VI, todos da Lei 6.123/1968. Na manifestação, o procurador-geral da República afirmou que a Constituição Federal prevê o instituto jurídico da contagem recíproca do tempo de contribuição entre o regime de previdência que abrange trabalhadores em geral – RGPS – e o exclusivo de servidores públicos – RPPS. “Esse instrumento resguarda a contribuição previdenciária feita pelo servidor ao longo dos anos, bem como não impossibilita a administração de punir o agente público que proceda em descompasso com o regime disciplinar a que está sujeito, qual seja, a contagem recíproca do tempo de contribuição entre os regimes”.
A contagem recíproca entre RGPS e RPPS pode ser entendida como o direito de somar o tempo contribuído nos dois regimes. Assim, o servidor público que perder os benefícios previdenciários a partir de sanção pelo Estado, nos termos do art. 99 da Lei 8.214/1991 passará a receber na forma da legislação do regime geral de previdência e de acordo com a contagem do tempo de contribuição, de modo a remanescer, integralmente, sob o RGPS.
Ainda segundo Augusto Aras, esse é o entendimento firmado pela jurisprudência do Supremo Tribunal. Sobre o tema, o PGR citou trecho de decisão do ministro Luís Roberto Barroso na ocasião do julgamento do Recurso em Mandado de Segurança (RMS) 34.499: “Nos termos do art. 201, § 9º, da Constituição Federal, para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei”.
Garantia constitucional – No parecer ao STF, o procurador-geral opinou pelo provimento parcial da ADPF 750. Contrário aos argumentos da associação, Aras refutou a hipótese de inconstitucionalidade da cassação da aposentadoria de servidor público como penalidade às infrações, uma vez que a perda do cargo ou função pública acarreta rompimento dos vínculos previdenciários, causado por ato ilícito do próprio servidor.
Em que pese os fundamentos apresentados pela Adepol, Augusto Aras entende que “não merece guarida a tese jurídica de que, com o advento da nova Reforma da Previdência Social, materializada na EC 103/2019, a Constituição Federal tornou inviável a aplicação da cassação de aposentadoria, motivo pelo qual afirma que as normas estaduais impugnadas haveriam de ser declaradas não recepcionadas”.
O regime jurídico-administrativo dos servidores públicos, na avaliação do PGR, não deve ser confundido com o previdenciário, que é relativamente autônomo. “A cassação de aposentadoria é sanção correspondente à demissão administrativa (inclusive a daquele que já tenha implementado os requisitos legais de aposentação, mas permaneça em atividade), em que o servidor igualmente perde, de forma proporcional ou total, a expectativa de retribuição decorrente das contribuições que fez ao longo da vida funcional”, pontua Augusto Aras.
Íntegra da manifestação na ADPF 750
Fonte: Ministério Público Federal