Por João Vilas Boas*
O sociólogo alemão Max Weber defende que a legitimidade de um governo não se sustenta apenas na autoridade formal, mas também na capacidade de entregar resultados percebidos como eficazes pela população. Sob essa ótica, reformas administrativas frequentemente são justificadas como formas de oxigenar e dar eficiência à máquina pública.
Nesse contexto, a reforma administrativa anunciada pelo governador Jerônimo Rodrigues (PT) tem gerado grande expectativa, especialmente entre sua base aliada. A pergunta que ecoa nos bastidores é: será que, após dois anos de mandato, finalmente veremos um governo com a digital do atual governador?
Nos corredores do poder, cresce a percepção de que Jerônimo enfrenta dificuldades em equilibrar os interesses de seus antecessores, o senador Jaques Wagner e o ministro da Casa Civil, Rui Costa. Essa disputa silenciosa coloca o governador em uma posição de refém de um embate que se reflete em cargos estratégicos, como na CONDER, onde Rui Costa defende a permanência de José Trindade, enquanto na EMBASA, o presidente Leonardo Góes, ligado a Wagner, é alvo de pressão para ceder lugar a um nome da preferência pessoal de Rui.
Apesar das negativas públicas sobre qualquer disputa de espaço entre os dois ex-governadores, na prática, o ressentimento é notório. Em 2022, Rui Costa desejava concorrer ao Senado, entregando o governo ao então vice, João Leão (PP), o que contrapunha o plano de Wagner. Esse histórico evidencia a limitada autonomia de Jerônimo para montar um secretariado que reflita suas prioridades políticas e técnicas, minando a possibilidade de efetivar o seu tom à administração da máquina estadual.
A efeito comparativo, cabe recordar: no segundo ano de mandato de Rui Costa, em 2016, o então governador tinha aprovação de 61%. Já Jerônimo, conforme levantamento da AtlasIntel/A Tarde de agosto, conta com 51% de aprovação, 10 pontos percentuais a menos que o ex-governador. Há de se mencionar que, a nível federal, em 2016, o Brasil vivia grave instabilidade política-econômica por conta do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT), enquanto que Jerônimo encontra um cenário estável e de parceria com o presidente Lula (PT).
Outro ponto de atenção é o volume de empréstimos solicitados pelo governo na Assembleia Legislativa. Até o momento, já foram mais de R$ 10 bilhões, muitos sem detalhamento técnico convincente, apoiados apenas no argumento de que o estado possui capacidade de endividamento. Esse cenário tem gerado desconfiança e críticas, inclusive entre aliados.
Por isso, a reforma administrativa não pode ser encarada apenas como uma simples troca de cadeiras para acomodar interesses políticos e, principalmente, partidários, estes, ávidos por espaços no primeiro escalão, a exemplo do AVANTE, que se consolidou dentro do tripé de sustentação governista formados pelo PT e PSD, após atingir um bom desempenho eleitoral nas eleições municipais, elegendo 60 gestores municipais, e do PP, que busca retomar espaços de prestígio no governo.
Seja como for, está claro que Jerônimo precisa construir uma marca própria para seu governo. Essa foi uma das grandes conquistas de Rui Costa, que marcou sua gestão com o conceito de “correria”, reconhecido tanto em nível estadual quanto nacional.
Além de imprimir uma marca forte e desvinculada das sombras de seus antecessores, para fortalecer sua relação com a opinião pública, Jerônimo também necessita afagar sua base aliada, especialmente deputados estaduais que se queixam do alto número de viagens do governador, o que tem reduzido seu tempo para atendimento direto aos prefeitos. Esse descontentamento revela a urgência de uma reconfiguração que privilegie uma maior presença política no gabinete e uma atuação estratégica mais intensa.
A tarefa que se apresenta é desafiadora, e o tempo é curto. Enquanto isso, a oposição, liderada pelo ex-prefeito de Salvador, ACM Neto, mantém forte influência, controlando 13 das 20 maiores cidades da Bahia. Esse cenário exige que Jerônimo Rodrigues jogue com habilidade para consolidar seu governo e chegar com força no pleito de 2026.
*João Vilas Boas é bacharel em Ciência Política, pós-graduado em Gestão Pública e graduando em Direito.