Nesta quarta-feira, dia 25 de setembro, o Supremo Tribunal Federal prosseguirá com o julgamento de duas ações que visam estabelecer o direito de Testemunhas de Jeová optarem por estratégias médicas que não utilizam transfusão de sangue de outra pessoa.
O julgamento teve início no dia 19 de setembro e cinco ministros já votaram concordando com a tese defendida por esses pacientes, o que inclui o direito à utilização dessas opções alternativas de tratamento mesmo que elas só estejam disponíveis em outro domicílio, devendo o Estado assumir os custos dessa transferência.
Várias cortes internacionais já julgaram casos semelhantes envolvendo o direito à autonomia de pacientes Testemunhas de Jeová. Um exemplo recente é a decisão de 17 de setembro do Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH), que condenou a Espanha a indenizar uma paciente Testemunha de Jeová por ter sua autonomia desrespeitada ao ser submetida a uma transfusão de sangue contra sua vontade.
Decisões reconhecendo o direito de recusa de transfusão de sangue pelo paciente maior e capaz já têm ocorrido em processos julgados por instâncias inferiores como, por exemplo, na Ação Civil Pública nº 5103690-53.2021.4.02.5101/RJ da 4ª Vara Federal do Rio de Janeiro proposta pelo Ministério Público Federal em face da União, na qual foi determinado por sentença de 23/04/2023 que os hospitais federais do Rio de Janeiro adotem protocolos de tratamento de pacientes que recusam transfusão de sangue à luz do chamado PBM (Patient Blood Management, traduzido como Programa de Gerenciamento do Sangue do Paciente).
Contudo, a apreciação deste tema pelo STF resultará numa uniformização do entendimento sobre este assunto pelos demais tribunais do país, já que esta decisão terá repercussão geral.
Sobre o PBM, a professora Vanessa Luiza Tuono, mestre em Saúde Pública pela USP e representante do Instituto Federal de Santa Catarina na Universidade Aberta do SUS (UNASUS) explicou que trata-se de “um conjunto de estratégias usadas para reduzir a perda de sangue, estimular a produção de células sanguíneas e gerenciar os fluidos do próprio corpo, inclusive a tolerância à anemia.
Pesquisas mostram que essas estratégias, além de reduzirem custos, ajudam a evitar complicações relacionadas ao uso de sangue doado”.
Durante a sessão de julgamento da semana passada foi reconhecido que as técnicas e medicamentos indicados pelo PBM já estão previstos para utilização pelo sistema público de saúde em diversos normativos do Ministério da Saúde. Entre vários exemplos, os processos citam a máquina de recuperação intraoperatória (relacionada na Portaria 346/201) e medicamentos como eritropoetina e fatores de coagulação, entre outros, previstos na RENEM (Relação Nacional de Medicamentos Essenciais).
Após avaliar as informações trazidas nos autos e nas sustentações orais que ocorreram há um mês, o relator de um dos processos, Ministro Luis Roberto Barroso declarou que “existe direito das pessoas que professam a religião testemunha de Jeová de recusa à transfusão de sangue em qualquer procedimento médico” e que estes pacientes “fazem jus aos tratamentos alternativos já disponíveis no SUS, ainda quando não disponíveis em seu domicílio”. Já o Ministro Gilmar Mendes, relator do outro processo, lembrou que “alguns desses tratamentos já são incorporados e realizados no âmbito do SUS, de modo que a liberdade religiosa impõe que se assegure às testemunhas de Jeová o acesso a eles”.
Além de Luis Roberto Barroso e Gilmar Mendes, votaram no mesmo sentido os Ministros Flávio Dino, Cristiano Zanin e André Mendonça, que também reconheceram ser juridicamente válida a manifestação da opção por alternativas médicas às transfusões de sangue feita por esses pacientes por meio de diretivas antecipadas ou de declaração prévia confirmada por testemunhas, devendo esta ser respeitada por médicos e hospitais.
Cinco ministros ainda declararão seus votos na sessão desta quarta-feira, restando um voto para que seja formada maioria em favor do reconhecimento do direito desses pacientes.