Decorridos cinco anos da apuração do homicídio de um estudante em operação policial na Maré, em 2018, o Ministério Público Federal (MPF), as Defensorias Públicas da União e do estado do Rio de Janeiro, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RJ) e mais sete instituições lançaram nota técnica que pede a federalização da investigação não concluída pela Divisão de Homicídios da Polícia Civil do Rio. Em 20 de junho daquele ano, Marcus Vinicius da Silva, de 14 anos, foi morto em operação da Polícia Civil numa comunidade local (Vila Pinheiro), onde se faziam prisões e averiguações ligadas à morte de um delegado de Icaraí (Niterói). Além do homicídio do estudante de 14 anos, a investigação inclui também o assassinato da única testemunha dos fatos, executada sumariamente em operação policial seis dias após a primeira morte e dias antes do data em que daria novo depoimento sobre o que tinha testemunhado.
No documento do Grupo de Trabalho Defesa da Cidadania (leia íntegra abaixo), o MPF e outras instituições frisaram que essa federalização (incidente de deslocamento de competência) é cabível por três fatos: (1) a ocorrência de grave violação de direitos humanos, devido à execução sumária em operações policiais; (2) a ineficácia, negligência e omissão de órgãos estaduais de persecução penal (Polícia Civil e Ministério Público/RJ) e (3) a necessidade de cumprir obrigações fixadas em tratados internacionais de direitos humanos.
O GT Defesa da Cidadania viu caracterizada a falta de imparcialidade da Polícia Civil em coordenar investigações envolvendo agentes de seus quadros, além da omissão do MP/RJ no controle externo da atividade policial, inclusive sem abrir uma investigação independente do caso. A hipótese de uma apuração independente se alinharia ao determinado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Protocolo de Minnesota (manual das Nações Unidas sobre a prevenção e investigação de execuções extrajudiciais, sumárias e arbitrárias).
As instituições do GT avaliaram que a impunidade nesse caso poderia levar à condenação do Brasil perante a Corte IDH, conforme se viu em caso análogo. “A prática de execuções sumárias com o uso dos autos de resistência à prisão ou à atuação policial para justificar a morte da vítima, o envolvimento de agentes de segurança pública e a ausência de órgão investigador independente, imparcial, transparente e diverso daquele que os agentes envolvidos integram foram circunstâncias que ensejaram a condenação do Estado brasileiro e que também se encontram presentes no caso objeto desta Nota Técnica”, sustentou o GT Defesa da Cidadania no documento.
Grupo de Trabalho – O GT Defesa da Cidadania é integrado por instituições estatais – MPF, Defensorias Públicas (DPU e DPE/RJ) e Mecanismo Estadual de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT/RJ) – e da sociedade civil: Ordem dos Advogados do Brasil/RJ (OAB/RJ), Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular Luiza Mahin, Fórum Grita Baixada, Frente Estadual pelo Desencarceramento do Rio de Janeiro, Maré 0800 Movimento de Favelas do Rio de Janeiro, Rede de Comunidades e Movimentos contra a violência e Iniciativa Direito à Memória e Justiça Racial/Baixada Fluminense-RJ. No MPF, o GT está ligado à Câmara de Controle Externo da Atividade Policial e Sistema Prisional (7CCR/PGR).
Leia aqui a íntegra da Nota Técnica.
Fonte: Ministério Público Federal