A Câmara de Consumidor e Ordem Econômica do Ministério Público Federal (3CCR/MPF) trabalhou em 2021 para proteger os direitos dos consumidores e garantir o bom funcionamento dos serviços prestados à população. Por meio de reuniões, participação em audiências públicas, criação de Grupo de Trabalho, elaboração de notas técnicas e recomendações, o órgão superior promoveu debates com diversas instituições visando buscar melhorias para o consumidor e garantir o equilíbrio da economia nacional.
Com esse objetivo, em janeiro, a 3CCR abriu procedimento para acompanhar os impactos socioeconômicos e concorrenciais causados pela saída da empresa Ford do Brasil, já que o fim das atividades poderia acarretar em prejuízos ao setor industrial e provocar a redução dos níveis de renda e emprego nacionais, afetando negativamente a economia.
Transportes – No setor de transportes, o setor ferroviário recebeu atenção especial do colegiado. Em fevereiro, a Câmara emitiu nota técnica contra a exigência de pagamento de acréscimo no valor de outorga nos contratos de prorrogação antecipada de ferrovias. O órgão superior defendeu que os recursos deveriam ser destinados a novos investimentos e melhorias na malha ferroviária.
Em abril, a 3CCR elaborou nota técnica analisando aspectos econômicos e concorrenciais da construção da ferrovia EF-170, chamada Ferrogrão, que pretende ligar o estado do Mato Grosso ao Pará. Segundo o documento, o projeto representa um avanço no desenvolvimento e integração da infraestrutura de transporte do país, com impacto direto na redução do custo de escoamento da produção agrícola brasileira. Além disso, contribui para ampliar a concorrência no setor, com possível diminuição nos preços do frete.
Em agosto, o órgão superior do MPF elaborou informação técnica favorável à aprovação do Projeto de Lei (PLS) 261/2018, que cria um novo marco legal para o setor de transporte ferroviário. O texto prevê novos instrumentos de outorga para ferrovias em regime privado, com participação mínima do Estado, e contém ainda definições técnicas para harmonizar a legislação do setor. A principal novidade é a possibilidade de exploração do modal por meio de autorização do Poder Público, e não apenas mediante concessão ou permissão. A proposta foi aprovada em outubro pelo Senado Federal e em dezembro pela Câmara dos Deputados, gerando a Lei 14.273/2021.
Saúde suplementar – A 3CCR também articulou esforços em busca de soluções para melhorar o atendimento dos usuários dos planos de saúde. Em fevereiro, o órgão superior se reuniu com a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para tratar de temas como as limitações na cobertura assistencial para os pacientes com Transtorno do Espectro Autista (TEA), a cobertura extraordinária de vacinas para a covid-19, a cobrança de reajustes suspensos em 2020 e a revisão do modelo de remuneração previsto nos contratos entre as operadoras e os prestadores de saúde, entre outros.
Na tentativa de padronizar e regularizar o atendimento dos planos de saúde em relação a pacientes autistas, o órgão superior recomendou à agência reguladora, em março, a suspensão imediata e a revisão regulatória de trecho de resolução da ANS que limitava o número de sessões de psicoterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e fisioterapia para reabilitação do retardo do desenvolvimento psicomotor de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Na avaliação do MPF, é preciso garantir aos usuários de planos privados o número de consultas prescrito pelo profissional de saúde responsável pelo atendimento e tratamento da pessoa com TEA.
A mudança no regramento da ANS foi aprovada pela diretoria da agência reguladora em julho, depois de ações judiciais propostas pelo MPF em oito unidades da federação e da recomendação nacional enviada pela 3CCR. Com a medida, os beneficiários de planos de saúde de todo o país passaram a ter direito a número ilimitado de sessões necessárias para o tratamento do transtorno. O resultado é uma conquista importante da instituição, que atua na pauta desde julho de 2019, quando foi ajuizada a primeira ação civil pública, em Goiás.
Também com o objetivo de aperfeiçoar a legislação brasileira em relação aos planos privados de saúde, a 3CCR participou, em 2021, de duas audiências públicas promovidas pelo Congresso Nacional para discutir mudanças na Lei 9.656/1998, a chamada Lei dos Planos de Saúde. Em agosto, o órgão superior frisou a importância de analisar a questão considerando os efeitos da pandemia de covid-19 no setor e sugeriu alterações na norma para reduzir o custo dos beneficiários. Em setembro, a 3CCR demonstrou preocupação com a Medida Provisória (MP) 1.067/21, que trata da atualização das coberturas obrigatórias pelos planos de saúde, e ressaltou que a medida precisa avaliar os impactos econômicos gerados para operadores e consumidores.
Proteção de dados – Assegurar a proteção de dados dos usuários de serviços públicos e privados foi outra pauta prioritária da 3CCR em 2021. Em fevereiro, o órgão superior elaborou nota técnica para alertar as autoridades acerca dos obstáculos legais à privatização do Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), incluído no Programa Nacional de Desestatização do governo federal. O documento esclarece que a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD – Lei 13.709/2018) veda a pessoas jurídicas de direito privado o tratamento de dados pessoais relacionados à segurança pública, à defesa nacional e à segurança do Estado. Para o MPF, além de contrariar a legislação, a privatização do Serpro ameaça a soberania brasileira, ao expor informações estratégicas para o país.
Outra atuação de destaque na temática foi a recomendação para que o WhatsApp adiasse a entrada em vigor e promovesse ajustes na nova política de privacidade do aplicativo, que autorizava o compartilhamento de dados pessoais com as empresas do grupo econômico do Facebook. O documento foi expedido em maio, numa atuação conjunta realizada em parceria com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) e a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon).
A iniciativa obteve sucesso e, em agosto, o WhatsApp atualizou a política de privacidade visando resguardar os direitos dos usuários. O aplicativo de mensagens firmou compromissos de ajustar o Aviso de Privacidade para o Brasil, nos moldes do que já realiza para usuários da União Europeia, entre outras medidas.
A 3CCR atuou, ainda, na questão das moedas virtuais. Em maio, o órgão participou de audiência pública virtual sobre indícios de pirâmide financeira nas operações das empresas Investimento Bitcoin e Atlas Quantum. A audiência foi promovida pela Comissão Especial criada para analisar o Projeto de Lei 2303/15, que propõe ao Banco Central o papel de supervisor de operações financeiras que envolvam moedas virtuais e programas de milhagem. A 3CCR defendeu que a regulamentação do setor é um caminho essencial para evitar fraudes como as pirâmides e afirmou que ela deve ser construída de forma conjunta, reunindo todos os órgãos que atuam na temática, como o próprio MPF, a Polícia Federal (PF), o Banco Central (Bacen), o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) e órgãos de defesa do consumidor.
Agronegócio – Em março de 2021, o órgão colegiado criou o Grupo de Trabalho Agronegócio com o objetivo de discutir o equilíbrio concorrencial e desafios do setor, com enfoque em propor soluções para as problemáticas referentes à área. Ao longo do ano, o GT promoveu uma série de encontros com acadêmicos e especialistas para compreender melhor o cenário atual, identificar oportunidades e traçar estratégias para a atuação do MPF no setor.
A 3CCR também apostou nas parcerias institucionais para melhorar a fiscalização e assegurar o bem-estar animal nas atividades culturais e esportivas equestres. A articulação do órgão superior resultou na assinatura, em outubro, de um termo de cooperação técnica entre MPF, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), Associação Brasileira de Criadores de Cavalo Quarto de Milha (ABQM) e Associação Brasileira de Vaquejada (ABVAQ). O acordo prevê, entre outros pontos, que a 3CCR desenvolva ações para divulgação dos protocolos e regulamentos; repasse ao Mapa demandas de aperfeiçoamento de normas regulatórias e colha manifestação do Conselho Federal ou conselhos regionais de Medicina Veterinária para subsidiar a atuação institucional.
Energia – A 3CCR defendeu a atuação integrada e a união de esforços para a resolução de impasses relacionados à construção da linha de transmissão de energia entre Manaus (AM) e Boa Vista (RR), conhecida como Linhão de Tucuruí. O posicionamento foi apresentado pelo coordenador órgão superior do MPF, subprocurador-geral da República Luiz Augusto Santos Lima, em audiência pública promovida pela Câmara dos Deputados em abril. A reunião virtual discutiu os efeitos da decisão da Justiça Federal de rescindir o contrato da concessionária Transnorte Energia, responsável pelo empreendimento, e determinar o pagamento de indenização por parte da União. A demora no processo de licitação ambiental, segundo a empresa, causou prejuízos e tornou o projeto inviável do ponto de vista econômico-financeiro.
Para aprofundar o conhecimento do MPF acerca do setor energético e debater soluções conjuntas para os desafios impostos pela escassez hídrica no país, a 3CCR promoveu, em novembro, um encontro de trabalho que reuniu, na sede da Procuradoria-Geral da Repúlblica, em Brasília, procuradores da República, integrantes do Ministério de Minas e Energia (MME) e de órgãos reguladores, e representantes do setor produtivo. O evento abordou os diversos aspectos relacionados à crise hidroenergética vivida pelo Brasil atualmente e priorizou o diálogo entre os diversos atores envolvidos para o enfrentamento do problema.
Administrativas – A composição da 3CCR permaneceu a mesma em 2021. O subprocurador-geral da República Luiz Augusto Santos Lima é o coordenador do colegiado, composto ainda pelos subprocuradores-gerais Alcides Martins e Brasilino Pereira, como membros titulares. Como suplentes, atuam os procuradores regionais Lafayete Josue Petter, Valquíria Quixadá e Waldir Alves.
Durante todo o ano, foram realizadas uma sessão de coordenação e nove sessões de revisão, com a deliberação de 924 procedimentos no total.
Fonte: Ministério Público Federal